terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Utopia




Que tal se delirarmos por um tempinho?
Que tal se fixarmos nossos olhos além da infâmia para imaginar outro mundo possível?
O ar estará limpo de todo o veneno que não venha dos medos humanos e das humanas paixões.
Nas ruas, os automóveis serão esmagados pelos cães.
As pessoas não serão dirigidas pelos carros, nem serão programadas pelo computador, nem serão compradas pelos supermercados, nem serão também assistidas pela TV. O televisor deixará de ser o membro mais importante da família e será tratado como o ferro de passar ou a máquina de lavar roupas.
Se incorporará aos códigos penais o crime de estupidez para aqueles que o cometem por viver para ter ou para ganhar, ao invés de viver para viver simplesmente, assim como canta o pássaro sem saber que canta, e como brinca a criança sem saber que brinca.
Em nenhum país irão prender os rapazes que se recusem a cumprir o serviço militar, senão aqueles que queiram servi-lo.
Ninguém viverá para trabalhar, mas todos nós trabalharemos para viver.
Os economistas não chamarão mais o nível de vida, ao nível de consumo, e nem chamarão qualidade de vida a quantidade de coisas.
Os cozinheiros não acreditarão que as lagostas adoram ser fervidas vivas.
Os historiadores não acreditaram que os países adoram ser invadidos.
Os políticos não acreditarão que os pobres adoram comer promessas.
A solenidade deixará de acreditar que é uma virtude. E ninguém, ninguém levará a sério alguém que não seja capaz de tirar sarro de si mesmo.
A morte e o dinheiro perderão seus mágicos poderes, e, nem por falecimento, nem por fortuna, se tornará o canalha em um virtuoso cavalheiro.
A comida não será uma mercadoria, nem a comunicação um negócio. Porque a comida e a comunicação são direitos humanos.
Ninguém morrerá de fome, porque ninguém morrerá de indigestão.
As crianças de rua não serão tratadas como lixo, porque não existirão crianças de rua.
As crianças ricas não serão tratadas como se fosse dinheiro, porque não haverá crianças ricas.
A educação não será privilégio daqueles que possam pagá-la e a polícia não será a maldição de quem não posso compra-la.
A justiça e a liberdade, irmãs siamesas, condenadas a viver separadas, ficarão juntas novamente, bem grudadinhas, costas com costas.
(...)
Serão reflorestados os desertos do mundo e os desertos da alma.
Os desesperados serão esperados, e os perdidos serão encontrados, porque eles são os que se desesperaram de tanto esperar e se perderam, de tanto procurar.
(...)
Seremos imperfeitos. Porque a perfeição continuará sendo o chato privilégio dos deuses. Mas, neste mundo,  neste mundo trapalhão e fodido, seremos capazes de viver cada dia como se fosse o primeiro e cada noite como se fosse a última.

(Eduardo Galeano)

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

"Coração apaixonado é bobo..."


Quando apaixonados, não vamos fundo aos fatos. E nos contentamos com impressões. Não há interrogatório sério, desistimos de avançar no primeiro silêncio. Não desejamos o desconforto. Perguntar uma desconfiança é constrangimento. Deixamos que o outro fale para não parecermos invasivos. Existe um período de licença, um estágio probatório, onde nenhuma dúvida segue sua curiosidade. Diria até que é coma alcóolico. Uma embriaguez de dopamina, oxitocina, adrenalina e vasopressina.
Ele aproveita a impunidade afetiva, para não arcar com cobranças. Abusa de sua compreensão, você acredita em qualquer coisa que ele diz porque não quer acreditar em outra coisa. É uma cumplicidade fanática, sem discernimento e pontos de apoio. Não tem margem para capturar contrapontos e atos falhos. (...)
O que preciso avisar é que qualquer relacionamento é uma decisão. Ou ele já tomou ou não tomou partido, entende? Começar é optar. Não é algo que vem com tempo. (...)
Não é um conto de fadas: todo conto de fadas tem um início triste e um final feliz. Quando o início é muito feliz, cuidado com o final triste. (...)

(Do belo, Carpinejar)

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Receita para mim, de Helena

 

Helena cismou em me entregar uma lição, que embora antiga, sempre me parece um pouco estranha...
Oh Helena, será mesmo que, falando tais coisas, contribuirá para minha metamorfose à mulher que julgas ideal? Por óbvio, diz ela.
Saiba, de pronto, que a mulher precisa ser doce, gentil, sutil, genial.
Precisa conhecer alguns idiomas, se almejar êxito na vida, e falar todas as línguas, se o quiser lograr no amor.
Essa mulher precisa beijar, pacientemente, a fronte que no ímpeto a despreza. Porque tem ela, a consciência de que só poderá mostrar seu verdadeiro encanto, se for capaz de insistir naquele afago tão nobre, tão seu.
Precisa cantar; Depois, desenhar o passeio feito ao lado do ser amado. E desenhar também a alma do doutor e do empregado.
Só lhe permitirá cair dos olhos uma lágrima. Esta mesma que disfarçará com maestria, como faz a barriga da mulher quando na primeira semana de gestação.
Amará em segredo, se o amor escolhido lhe for proibido. Amará também em segredo, se esse amor se lhe apresentar como bom. (Acredite: quem revela o amor que faz o coração palpitar, tende a destruir muito fácil o encanto que seus mistérios construíram lentamente).
Será dama, fera, coragem, companhia. Será o bom conselho, a incansável serva. Será candura e diversão.
Com ousadia, também será a mãe das contradições.
E por isso não se explicará.
Porque, na verdade, sabe bem que, aquilo que saltar aos muitos olhos, nada mais poderá ser, do que as tramas de suas múltiplas linhas bordadas. Bordado complexo; arte pouco compreensível, como assim o é o sentir do amor.
De todas essas coisas, recomendo somente uma: cultive, sem receio, mulher, o amor da singela e graciosa menina! E vomite sem pensar, menina, aquele amor ilimitado e quente da valente mulher...


* P.S - Estes são traços, das conclusões que tive, observando o agir e o sentir de mulheres que teimam em me ensinar a também ser uma! Como fez, inexplicavelmente, a Helena de Machado de Assis. São traços que vou tomando delas em troca de deixar, pelo caminho, pedaços dos meus que não me parecem mais tão úteis. Ou que já me causaram muito sofrimento. São esses, seus deliciosos (e eficazes) dizeres...

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Receita de Mulher



[...] Ah, que a mulher dê sempre a impressão de que se se fechar os olhos
Ao abri-los ela não mais estará presente
Com seu sorriso e suas tramas. Que ela surja, não venha; parta, não vá
E que possua uma certa capacidade de emudecer subitamente e nos fazer beber
O fel da dúvida. Oh, sobretudo
Que ela não perca nunca, não importa em que mundo
Não importa em que circunstâncias, a sua infinita volubilidade
De pássaro; e que acariciada no fundo de si mesma
Transforme-se em fera sem perder sua graça de ave; e que exale sempre
O impossível perfume; e destile sempre
O embriagante mel; e cante sempre o inaudível canto
Da sua combustão; e não deixe de ser nunca a eterna dançarina
Do efêmero; e em sua incalculável imperfeição
Constitua a coisa mais bela e mais perfeita de toda a criação inumerável.


(Vinicius de Moraes)

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Ainda pensam assim sobre o casamento?




"[...]O casamento não é uma solução, penso eu; é um ponto de partida. O marido fará a mulher. [...] não se pode exigir tudo: alguma coisa é preciso sacrificar, e do sacrifício recíproco é que nasce a felicidade doméstica."

(Palavras da Helena, de Machado de Assis)


** P.S - Se a resposta for afirmativa, talvez, um dia, eu resolva me casar...

É assim...(Um "para sempre" que parece não acabar)


 As coisas que não conseguem ser olvidadas continuam acontecendo.
Sentimo-las como da primeira vez,
sentimo-las fora do tempo,
nesse mundo do sempre onde as datas não datam. 
Só no mundo do nunca existem lápides... 
Que importa se – depois de tudo – tenha "ela" partido,
casado, mudado, sumido, esquecido,
enganado, ou que quer que te haja feito, em suma? 
Tiveste uma parte da sua vida que foi só tua e, esta, ela
jamais a poderá passar de ti para ninguém.
Há bens inalienáveis, há certos momentos que,
ao contrário do que pensas,
fazem parte da tua vida presente
e não do teu passado.
E abrem-se no teu sorriso mesmo quando, deslembrado deles,
estiveres sorrindo a outras coisas.
Ah, nem queiras saber o quanto deves à ingrata criatura...
A thing of beauty is a joy for ever
disse, há cento e muitos anos, um poeta
inglês que não conseguiu morrer.

(Mário Quintana) 

P.S: Essas coisas continuam acontecendo. Por mais que você não as admita, por mais que você não perceba! 
Todas as noites, elas gritam em sua lembrança, através de sonhos. Infinitos sonhos...

domingo, 11 de dezembro de 2011

Peça um drink...



Nunca, jamais diga o que sente. Por mais que te doa, por mais que te faça feliz. Quando sentir algo muito forte,
peça um drink.

(C.F.A)

Entendi!


Você não saboreou meu suor, eu não lhe provei as lágrimas. 
É no líquido que somos desvendados.

Martha Medeiros